domingo, 4 de outubro de 2009

Botequim 3 Amigos

Fátima Figueiroa

Como de hábito, em sua ida diária ao Botequim 3 Amigos na cidade, Alvarez entrou e cumprimentou, entre os dentes, o garçom; boa tarde Felizardo traga o de sempre, por favor. Sentou-se na sua mesa cativa de frente para a janela olhando a rua, sempre com a expectativa de chegar algum parceiro de copo para bater um papo ou até mesmo alguma discussão. Rapidamente Felizardo, como o próprio nome diz, veio sorridente com o chope de acordo com sua exigência, colarinho e copo pequeno, colocou sob a mesa dizendo, Alvarez vai pedir algum aperitivo até chegar quem você espera? Não espero ninguém! Traga azeitonas, sem o caroço. Felizardo já sabendo que neste horário, final de expediente, sempre vêm os mesmos fregueses antes de irem pra casa, caprichou na porção de azeitonas, colocando azeite e pão.

Chegou o aperitivo, Alvarez pediu mais um chope. Nisso chega um dos assíduos como ele. E ai, tudo bem? Disse Jorge – se aproximando da mesa para se sentar. Tudo bem sim, mas não sente na minha mesa antes que eu o convide, você não sabe se espero alguém e se sua presença poderá atrapalhar minha companhia quando chegar. Jorge recuou, se surpreendendo com o tom e a grande sinceridade de Alvarez. Saiu de perto e foi para o balcão conversar com o copeiro tirador de chope.

Passado algum tempo, Alvarez já no quarto chope, relaxado, sorridente e piadista chama Jorge em voz alta para se sentar, perguntando: por que não tinha se chegado antes? Jorge, humildemente e respeitoso à idade de Alvarez, fingiu não ter entendido a grosseria anterior e sentou-se junto com ele, pediu um chope e mais azeitonas.

Alvarez começa a contar sobre sua historia de vida e dos filhos, dizendo que há dias não os via, possivelmente iriam até lá após saírem do trabalho. Olha no relógio; está quase na hora de terminar o expediente de um deles, você já os viu por aqui? Sabem que, quando querem me ver , aqui é o melhor lugar.

São bem apessoados, escolhem as mulheres que querem, é uma fartura da espécie em cima deles, uns garanhões. Faz-me lembrar da minha juventude quando músico da banda de uma importante cantora de minha região, uma colônia portuguesa na África, onde nasci.

Era uma facilidade tê-las, ser músico propiciava algumas vantagens, esta era uma delas. Antes da minha vinda para o Brasil, trabalhei como marinheiro de um navio norueguês. Era outra novidade em termos de mulheres, cada cidade que ancorávamos mais mulheres diferentes. Quando cheguei ao Brasil, escolado, estava na fase do sossego, logo me casei, esta sim especial . Mas agora não quero nem ver essa raça, já tive a que tinha que ter para fazer meus filhos, dá muito trabalho, gastam muito dinheiro, ficam se ocupando com coisas da vaidade , viagens e outras besteiras. Jorge interage discordando de alguns pontos e concordando com outros.

Chega a hora do final do expediente na cidade, a calçada cheia de gente passando.

O Bar 3 Amigos ficava na mesma quadra da Secretaria de Administração da Prefeitura onde tinham muitos funcionários e fregueses do bar, um desses era chefe de setor da repartição da secretaria, passava toda quinta feira para comer o bolinho de bacalhau com dois chopes. Neste dia passou com sua funcionária, a “pudica” Pilar, que entrou no recinto toda rebolativa, perfumada, chamando a maior atenção. Foram direto ao balcão cumprimentaram o dono, no caixa, escolheram uma mesa no canto, quase escondida.

Alvarez e Jorge conversando sobre o assunto mulher surpreendem-se com a figura de Pilar, que despertou curiosidade por ter chegado com um homem, aparentemente mais velho, sentando em local mais reservado.

Entreolharam-se com interrogação. Jorge faz comentários elogiosos sobre a moça, demonstrando algum interesse em se aproximar, caso haja oportunidade.

O Garçom vai à mesa e serve mais chope, é indagado pelos dois sobre a moça que acabara de entrar; Quem é a princesa que chegou agora? Não sei o nome, mas trabalha na secretaria da prefeitura, vem aqui muito pouco, às vezes com aquele cara; Já veio com três amigas, mas não é freqüente. Alvarez comenta: Jorge isso é complicação na certa, deixa disso.

Toca o celular de Pilar, ela levanta da mesa e vai para a calçada falar com mais privacidade, longe do chefe. Ao passar pela janela do bar se depara com Alvarez, homem muito mais velho, mas com certo charme e estilo, viu logo uma tatuagem no antebraço aparecendo na posição que Alvarez se encontrava, com o cotovelo na mesa e a mão na fronte. Levantou os olhos e bateram o olhar. O Coração de Pilar disparou na mesma hora.

Pilar chamou a colega do trabalho para encontrá-la no bar, voltou para a mesa, mudou sua cadeira de posição, ficando de frente para Alvarez, que sequer deu a entender algum interesse por ela.

O Chefe tinha hora para sair, Pilar ficou aguardando a amiga que estava para chegar. Neste intervalo ela já estava sonhando, será que é este o homem da minha vida? Vejo que é mais velho, mas será uma nova experiência, quem sabe é para minha felicidade!

Quando chega a amiga, ela mostra o homem que cruzou olhar, veja o que acha? Amiga faz o comentário, é muito velho Pilar. Sim, mas não é muito, é mais velho, pode ser a minha chance de ser feliz com alguém.

Acabou a tranqüilidade de Alvarez, a partir daquele momento Pilar encasquetou que seria ele o homem da vez, perguntou ao garçom quem era ele, se ia aquele bar com freqüência. O garçom deu todo o serviço para ela, que passou a freqüentar o bar diariamente , perseguindo o pobre coitado do Alvarez que, com idade avançada, já tinha dado por visto sua vida amorosa, mas mal sabia ele que somente estava começando uma batalha para encarar a persistência da conquista de Pilar em realizar uma fantasia criada por ela.

Personagens :

Alvarez

70 anos, português da colônia africana, fala alto e com algum sotaque. Machão, é aparentemente típico freqüentador de botequim barato.O faz mais para ser superior aos colegas de cerveja que por falta de dinheiro, ou classe. É extremamente inteligente, e alegre quando bebe. Tem uma cultura bastante singular de quem viveu uma vida diferente, pois foi musico em Cabo Verde (guitarrista de Cesária Évora) e marinheiro em um navio norueguês antes de vir para o Brasil. Alvarez é comerciante bem sucedido, hoje aposentado. Gosta de estar no comando e adora frases de efeito. Tem, é claro, uma barriga de chope invejável e tem segundo ele mesmo a primeira tatuagem colorida do Brasil, feita ainda no navio norueguês. Abomina as mulheres, teatro, cinema, restaurante e viagens à Europa. Não tem nenhum hobby, e morre de orgulho dos filhos, que teve com a ex-mulher escritora, quando eles aparecem no botequim com seus carrões e suas lindas namoradas estrangeiras.


Pilar


Dava um trabalhão besuntar o rosto de hipoglós antes de dormir, dica da sua amiga da repartição. De manhã,depois do banho, gostava de passar um creme bem perfumado pelo corpo todo. Principalmente nos seios. Considerava essa a sua melhor parte. Batom só vermelho. E bastante rímel, enfim, trinta e sete anos, tinha que se cuidar. Na hora de escolher a roupa é que ela se complicava. Sua cintura ultimamente alargara, tinha que colocar a cinta para poder vestir os vestidos que mais gostava.

Nesses dias sabia que tinha que evitar a sala do chefe ou de passar perto dele,

Não queria que ele sentisse aquela textura estranha embaixo da roupa. Justamente quando ele vinha com aquele jeito de lhe enlaçar a cintura e de lhe falar ao pé do ouvido. Aquelas coisas que ela fingia ficar chocada. Então nos dias de vestido provocava de longe e nos dias de calça,chegava a sentar no colo dele. Ela, uma sedutora. Tinha que ser assim, das seis irmãs, era a única que não tinha marido.

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